April 09, 2008



chegara do colégio mais uma vez com a típica cara de poucos amigos. de fato, deveriam ser poucos os que ousavam se aproximar. sorriso naquele rosto era coisa rara. e mais raro ainda era o movimento dos lábios acompanhar a alma e transparer no olhar. os tais poucos sorrisos tinham muito mais crueldade por trás do que se poderia esperar de uma criança de sete anos. largou os sapatos na soleira da porta e correu, ainda de meias, para um canto da sala. e ficou lá sentada, numa posição por demais defensiva para um ser humano, parecia um bicho de tão acuada. pôs-se a fitar uma aranha que lutava, em vão, contra a sua própria teia. quanto mais agonizava, mais se afastava da remota possibilidade de se libertar dali. a garota observou a batalha da aranha contra ela mesma, os olhos refletiam uma cavernosa perplexidade. sentiu certa empatia pelo bichinho. poderia ser esmagada por forças superiores a qualquer momento, estava presa às teias tristes que havia tecido para se proteger dos outros e se fosse comparada ao mundo, seria tão insignificante quanto aquele pequeno aracnídeo comparado ao aposento. era demasiadamente pequena e os gigantes não seriam complacentes com ela, nunca haviam sido. era como a alice, só que sem coelho, sem razões pra ir seguindo pela estranheza afora. a aranha era amiga, reconhecia naquela quase-ser marrom cheio de patas sua impotência. queria encontrar em si mesma, agora, a resignação. então foi deitando, lentamente, no ártico chão da sala. ao sentir sua espinha encostar na superfície gélida deu um suspiro e apertou os olhinhos. foi se entregando. e se entregar era tão bom...